novembro 23, 2015

Bali - Equilíbrio Sempre




"O essencial estava presente: o nada que preenche o todo!"


Alguém já ouviu falar em vacuidade? É um conceito na filosofia budista que explica o vazio na existência por si mesmo, ou seja, tudo é interdependente. Não tenho pretensão em falar do assunto, mas lembrei da vacuidade quando cheguei ao extremo da minha força física.

Tudo começou com o desejo de conhecer o "Vulcano".

Acordei de madrugada e peguei um longo trajeto de estrada. Uma estrada sinuosa que me fez passar mal. Pronto, já começava bem. Com sono e agora mal do estômago e teria que andar muito.

Tempo de caminhada: 3 horas morro a cima para ver o sol nascer da cratera do vulcão.

Caminhada? Sacanagem! Quase escalada na escuridão com pedras vulcânicas soltas no chão. O vulcão ainda é ativo, o que animava ainda mais nosso trajeto, imaginando que embaixo dos nossos pés, bem perto, tinha uma atividade fervilhante.

Fervilhando estava meu batimento cardíaco. A cada passo acelerava e a respiração ficava mais difícil.

_  Não fala! Concentra-se na respiração. Alguém passava orientação de como fazer um bom "treking".

O personagem da vez: Adhy. Adolescente balinês, de família tradicional de guias turísticos. Ainda em período escolar, divide o tempo entre escola e subidas ao vulcão. Sorriso aberto e vigor de quem começa a vida. Ainda escuto as gargalhadas dele enquanto eu bufava. Paciente e generoso. Praticamente arrastou as mulheres do nosso grupo ao topo com tanto incentivo.

Éramos cinco com Adhy. Ainda estava noite. Céu escuro e pouco se enxergava mesmo com as lanternas que deveriam focar na trilha. De longe avistava quem estava subindo a montanha, cheio de pontinhos de luz. Linda vista e desesperadora quando percebi que já estava cansada e ainda tinha muito chão. Focar aquela lanterna no chão e ver o balançar da luz só aumentava meu enjoo e ficar na escuridão, era tropeço na certa.

_ Devemos acelerar se não querem perder o nascer do sol. Adhy dava as coordenadas.

Vulcão Mount Batur. A última erupção foi em 2000.


Começo da trilha.

Fumaças por toda parte. 

Depois de quilômetros, começa a subida. Sobe, sobe, sobe... Chegou? Não! Não estávamos nem na metade e a cada passo faltava mais ar. Quanto mais olhava para cima e via que as luzes das lanternas a nossa frente eram pequenas, ficava mais pessimista. Não vou conseguir. Já estou muito cansada.

Nesse momento começou um desafio pessoal de "eu posso". Não levantei da cama, vim até aqui passar frio para não chegar. Parecia impossível. Pararia a qualquer minuto.

Nem perguntava mais se faltava muito e qual era o ritmo. Apenas tentava controlar minha mente para não desistir. Ouvia ao longe:

_ Mantenha o ritmo. Não para. Respira!

Foi aí que descobri que a vida estava me levando ao máximo, ao extremo da minha capacidade física. Quando o corpo quase desliga, somente a mente controla.

Os minutos finais foram cruciais, quanto mais subíamos, mais frio ficava, mais difícil era respirar e o cansaço aumentava, assim como a inclinação. Alguns momentos, só um puxando o outro.

O dia estava chegando e com ele e algumas lágrimas nos olhos dos últimos passos. Chegamos ao topo junto com o Sol. Felicidade indescritível! Felicidade de superação e felicidade em apreciar o mundo por cima das nuvens.

Comungamos o momento com um simples café da manhã entre amigos. Café típico das montanhas? Talvez não, era o que os guias conseguiam comprar para levar: chá, ovo cozido e pão com banana. Tudo feito com uma fogueira do calor do nosso amigo vulcão.

Compartilhando o amor, apreciando a harmonia da natureza. Do solo brotava fumaça, pulsação do vulcão falando que ainda vivia. Sentia a vida nos meus pés. O essencial estava presente: o nada que preenche o todo!

Nada existe por si só. Até a natureza trabalha em conjunto.

Cada paisagem, uma pintura.

Café da manhã das montanhas.

Cratera do Sr. Mount Batur.

Olha onde nosso amigo vive.

Parece foto de avião, mas dessa vez estávamos do lado de fora.

Ajudinha na descida. 

Abraço amigo.

O tempo poderia parar...


















novembro 17, 2015

Bali - Simples ser feliz




"Filosofando ou jogando conversa fora, o bom da vida é ter mente aberta."


Todos nós buscamos a felicidade. Queremos ser felizes, claro! Quem não quer? Mas onde se compra essa tal felicidade? Bali? Talvez!

Outro dia assisti a um vídeo de um filósofo que falava: "felicidade é uma vibração intensa, mas não é um estado contínuo. São episódios que você sente a vida te levar ao máximo, mas não é estado de euforia. Felicidade vem do que é realmente essencial. Precisamos buscar na fonte primária para termos autenticidade." Bravo, lindas palavras e ainda mais lindo o vídeo e...

Sempre fugi das aulas de filosofia e "papo cabeça" nunca foi comigo. Preferia fazer amigos, conversar e provar a vida de outra forma. Mas a Ásia me fez refletir e filosofar. E estar novamente em Bali é um mergulho em pensamento e sensações.

O que realmente é essencial? Não acredito em uma resposta matemática igual para todos. Mas o que constatei foi encontrar a tal felicidade em lugares com tão pouco, tão simples. Como ele também dizia "o simples não é simplista". Não, não é! E assim costuro chegando a Bali.

O simples de Bali é o essencial deles, mas nada simplista aos nossos olhos. Eles buscam na fonte e por isso vemos autenticidade em tudo, nas roupas, nos jeitos, na arquitetura, na religião, na cultura. Tudo está interligado. A vibração é tão intensa que olhamos atentos, querendo desmistificar, entender e elaborar uma equação que caiba à nossa vida.

_ Não acreditamos apenas no preto e no branco, existe o cinza entre eles. Os tons de cinza são o equilíbrio entre as extremidades. Explicou Made.

Esse é outro Made. Empreendedor, de casta elevada que preferiu seguir trabalhando com o turismo. Não tem carro próprio, aluga uma "Van", mas tem empresa com página na internet. Inteligente e com sacadas rápidas nos levava à risada.

_ Tudo que é demais, não é bom! Pouco amor, te deixa triste. Muito amor, mata você! Tudo é equilíbrio. Quando está feliz, está em equilíbrio. É isso que tem que buscar.

Veio o conselho entre um passeio e outro. Não estávamos filosofando, mas aqui eles são assim. Nascem filosofando nos conceitos simples da vida. Falam de maneira simplória, quase como crianças aprendendo a escrever. Encanta e faz pensar!

Templo de Tanah Lot.

Termina o dia na praia de Kuta.


Como crianças, dessa vez vim até Bali atrás de amigos brasileiros. Um casal especial que passava férias perto de casa, não pensei duas vezes em fazer as malas e desembarcar na ilha para aproveitar nem que fossem poucos dias. Foram dias deliciosos que compartilhamos aventuras e dividimos conhecimento. Juntos fizemos amigos fora dos padrões.

Gale, uma australiana despojada apareceu no corredor de pijama. Estávamos parados no lobby, após o jantar. Não paramos de conversar. Já era tarde, mas a vontade de aproveitar mais cinco minutinhos fala mais alto. Compartilhamos nossas vidas madrugada adentro. Parecia que a conhecíamos de longa data.

Gale ficará na nossa memória com uma frase: it's not fair! (Não é justo). Referindo-se as nossas idades versus a aparência. O rosto dela repetindo sem parar, ficou registrado e nos leva a boas risadas ainda hoje.

Filosofando ou jogando conversa fora, o bom da vida é ter mente aberta para conhecer o diferente e fazer amigos novos. Usar o simples para ser feliz.


Depois do filme, a família do Ketut montou
 um hotel para retiro e spa!
Lugar lindo e barato!

Pescador em Padang Padang.

Templo nos fundos de um café em Ubud.

Vestimenta balinesa. 

Floresta sagrada dos macacos. 

Virei parte da família. Hora do almoço!

novembro 11, 2015

Bali - Contradição e Balanço



"Mais ou menos como nós: quando temos um espaço no quintal, corremos e construimos lindas piscinas. Eles mesmo sem espaço montam os templos."


Pisei em Bali sabendo que queria ficar. Senti algo estranho e não era o "famoso" frio na barriga.

Bali se revela aos poucos. Cada bairro tem uma atmosfera diferente, mas só compreendi a personalidade de cada área na segunda vez que voltei com mais tempo.

Às vezes, parece apenas uma cidade grande com uma arquitetura misturada, outras é perfumada pelo ar praiano. Ainda pode-se dizer do cheirinho de mato do campo ou da boêmia bucólica das ruas estreitas.

A ilha é a única hinduísta, entre tantas outras muçulmanas que compõe a indonésia. A religião não se faz presente apenas na decoração e nos muitos templos, mas está na atmosfera. Como eles vivenciam e tentam expressar sua filosofia. O hinduísmo balinês tem as suas características próprias. Apesar de ter vindo com mercadores indianos há muitos séculos, acabou distanciando de alguns conceitos e criando outros. Mas descobri o que Bali "TEM" com o Made, um balinês simpático, muito espiritualizado e que adorava contar sobre sua cultura.

Made é o nome dado ao segundo filho. Sobrenome por aqui não existe -- você é o Made, da província "X", da região "Y" e do templo "Z". O nome do templo é o nome da casa da mãe e consequentemente seu sobrenome. Aqui cada casa tem um templo, você consegue avistar nos  jardins por cima dos muros de pedra. Mais ou menos como nós: quando temos um espaço no quintal, corremos e construimos lindas piscinas. Eles mesmo sem espaço montam os templos.

Quando a mulher casa, não recebe o nome do templo do marido (sobrenome), mas passa a morar na casa da família dele e a pertencer ao mesmo templo. Dentro do mesmo terreno, em volta de um templo, observam-se muitas casas, uma ao lado da outra. Muitas famílias moram juntas do mesmo. Já imaginou a confusão que seria aplicar algo semelhante na nossa cultura?

Mas o que diferencia esse pequeno povoado que manteve as raízes, é o equilíbrio. Eles acreditam e praticam o equilíbrio como cultura de paz.

Cada balinês faz três preces por dia, para a harmonia com as pessoas, com o meio ambiente e com Deus - o universo. Dizem o quanto é importante gerar e cultivar pensamentos positivos, de paz e ter uma mente equilibrada. Além das rezas, meditam e fazem yoga diariamente. Conseguem imaginar uma sociedade assim? Isso explica o porquê tantas pessoas que chegam a Bali e nunca mais irem embora.

Templo Ulun Danu Bratan.
Localizado nas montanhas: é difícil um dia que não esteja nublado.

Templo usado para cerimonias de purificação. Localizado dentro da
floresta dos macacos, fica escondido perto do riacho.  

Bairro residencial com templos nas ruas e dentro das casas. Família com
vestes religiosas indo para cerimonial na época de cremação coletiva. 

Mas como todo lugar, descobrimos algumas contradições como os sacrifício de animais. Triste realidade, preferi não focar no assunto.

Na segunda ida a Bali, poucos meses depois, um outro Made (sim, metade da cidade chama Made) perguntou:

_ Você não gosta de briga de galo?
_ O quê????

Parecia uma máquina mostrando os bichinhos presos em cestos no meio da rua esperando uma rinha. É tradição local. Tão absurdo em imaginar que isso ainda acontece em nosso país, mesmo sendo proibido. E piorou quando o assunto foi para sacrifício animal na religião.

_ Tem um tipo específico de cão que oferecemos!

_ O quê? Só pensava: Não posso ouvir isso! Está estragando tudo o que penso de Bali. Queria gritar!

Depois ouvimos a história de um ocidental que foi morar na ilha e estava abrindo uma loja. Ele foi coagido a fazer o sacrifício de animais: seriam dezenas de galinhas que após mortas seriam enterradas ao redor da loja. Isso traria proteção e boa sorte. Ele se negou, pois não queria envolvimento com esses ritos, mas logo foi alertado. Se você não fizesse "poderia" ficar sem o negócio. Boicote ou atentado? Ele não sabe dizer mas não pagou o preço para saber. Topou e deixou que fizessem.

Corta! Corta! Corta! Gritou meu "eu interior" como um diretor de cinema.

Deixa ficar com a visão linda da ilha harmoniosa, voltando para o mundo fantástico de Carolina... E quando percebi estava no meio dos campos de arroz. Eles não perdem a oportunidade, cada pedacinho de terra, tem uma plantação. Mesmo nos bairros que não estão na zona rural, como no excêntrico Ubud. A região cultural e descolada fica no centro da ilha, onde também tem a famosa floresta dos macacos. Quem não curte macacos, tome cuidado ao passar por aqui. Eles gostam de chamar atenção, pedir comida e roubar sacolas. Os danadinhos arrancam da sua mão e só vão descobrir o conteúdo em cima dos postes e telhados.

No fim descobri o porquê muitas pessoas não vão embora, e os que vão, querem voltar. Como nós, brasileiros, Bali tem um povo carismático e hospitaleiro. Uma ilha encantadora com atmosfera religiosa que contagia até o mais cético. Entendendo ou não, a sensação é de querer morar aqui. E a esperança é de voltar!

Saio de Bali pensando nem tanto ao mar e nem tanto a terra. Nem muito à piscina e nem muito ao templo. O equilíbrio entre os dois é um bom caminho a seguir.

E como um sábio amigo diz: tem hora para tudo.

Campos de arroz. Paisagem tradicional em Bali.

Templo Taman Ayun,
patrimônio mundial da UNESCO.

Um templo em cada esquina.

Oferendas deixadas nas calçadas.
Tem que tomar cuidado para não pisar. 

Macacos lindos e amáveis na floresta sagrada dos macacos
no centro de Ubud.

Mãe amamentando enquanto observava turistas.

Fiz parte da família. 


novembro 06, 2015

Guerra de carrinhos



"Hoje o carrinho faz parte do meu corpo, como a bolsa. Qualquer coisa que pego o carrinho está sempre encostado em mim. Assim protejo o coração do enfarto e afasto os olhos na busca do carrinho alheio."


A primeira base de sobreviventes em qualquer país é a comida. Ser vegetariana e natureba só complica ainda mais... Se já era difícil escolher um prato no cardápio durante uma viagem, imagina fazer a compra do mês.

A saga começou há apenas dois dias após meu desembarque.
_ O que precisamos? Você fez a lista?
_ De tudo! Passa e pega...

Quem gosta de fazer compras em mercadinho de bairro ou algum local menor não o encontrará por aqui. O menor de todos leva o nome Big na frente. Isso mesmo, Big Aeon, quer dizer que é uma das menores unidades daquele supermercado. As grandes redes vendem de tudo, como já estamos acostumados, mas e a preguiça de andar por todos os andares do Big, Hiper, Super e por ai vai. Conheci os principais nomes e acabei me especializando em buscar novas opções em lugares mais distantes que têm produtos específicos. Calma, chego lá.

Quem come tudo industrializado fica mais fácil, já que muitos rótulos estão em inglês e são muitas as variedades de produtos importados. Agora se é adepto de uma dieta fresca, vai tremer na base até entender o que são aqueles nomes. Ops! Não tem como traduzir, muitos estão em chinês e não temos no nosso país. Logo: só Deus sabe o que são. Criei uma lista. Comprava o que achava bonito, fazia e anotava o que gostava. Fiz uma longa pesquisa sobre verduras e descobri que a maioria não tem aqui. Mas tem coisas semelhantes da mesma família. Ufa!

Porém a maior aventura de todas aconteceu no segundo dia de Malásia. Supermercado gigante, cheio e tinha que passar de corredor em corredor domando a ansiedade em voltar logo para dormir (fuso +11). Assim que lotei o primeiro carrinho, deixei uma amiga tomando conta e continuei a piração escolhendo coisas do que um dia poderia precisar. Quando você não tem nada em casa, vai precisar do quê? De tudo! Mas lógico que nesse tudo vai esquecer das coisas principais. E assim o segundo carrinho estava pela metade quando deixei os dois juntos para pegar um produto no fim do corredor.
_ Você pegou um dos carrinhos? (Ouvi ao longe... Parecia um sonho...)
_ Não! Porque?
_ Sumiu! (O sonho virou pesadelo)
_ Roubaram nosso carrinho de novo????

Um dia antes... Andava por uma loja de departamento comprando lençol, panela e outros objetos de sobrevivência, quando percebemos que o carrinho que deixamos por cinco minutos ao nosso lado enquanto víamos um armário, havia desaparecido! Vai ver que se confundiram. Acontece!

Novamente, não! Sai procurando o dito carrinho pela metade e nada de encontrar... Estava ali fazia 4 horas pensando no que comer, no que limpar e obviamente que não lembraria dos produtos que havia pegado. Achamos que era apenas má sorte de iniciante e a história virou comédia entre os amigos. Fiquei conhecida pela fúria ao carrinho. Até que alguns meses depois... Em outro supermercado... Em outra região da cidade....

_ Esse carrinho é meu! Ouvi uma voz gritando!
_ Ah desculpa... Quase como um sussurro...
_ Desculpa? Você estava pegando um carrinho com produtos dentro...

E assim começou a guerra do carrinho... A menina estava com dois cestos lotados nas mãos, e provavelmente por preguiça não quis andar até a entrada para pegar um vazio, então resolveu pegar o primeiro que encontrasse... Só não esperava encontrar a louca pelo carrinho que estava ao lado focada na busca de um papel higiênico, outro artigo que se deve ter olho clínico ao comprar.

O carrinho vira uma arma.

Eles não servem apenas para colocar comida...

Hoje o carrinho faz parte do meu corpo, como a bolsa. Qualquer coisa que pego o carrinho está sempre encostado em mim. Assim protejo o coração do enfarto e afasto os olhos na busca do carrinho alheio.

Após algum tempo, a saga do supermercado perfeito virou experiência de vida. O mais engraçado é que encontro um produto em cada canto e não meço esforço em buscar o requeijão cremoso da Arábia Saudita em um, o queijo "mozzarella" tipo cavalo no outro, o vinagre de uva (raro por aqui) em outro e as proteínas de soja. Ah as proteínas...

_ A senhora vai levar tudo? Um senhor perguntou.
_ Sim, mas se o senhor quiser posso dividir.
_ Não, pode levar, era só curiosidade. Deve gostar muito disso!

Estava há semanas em busca daquele presunto de whey e soja tipo chinês. Comprei tudo quando encontrei!

E para fechar com chave de ouro:
_ Você está de mudança? Pergunta um vizinho no elevador.
_ Não. Só fui ao supermercado.
Nem eram tantas sacolas, mas o rapaz ficou inconformado e me senti coagida em dar alguma explicação para que acalmasse aquele olhar:
_Gosto de escolher as comidas frescas e não comprar pela internet.
Um Ahhhh soou no ar.

As pessoas não têm o costume de fazer e levar as compras. Muitos usam sites, mas as gostosuras que estamos acostumados precisam ser localizadas com olhar clinico e sistêmico, de gôndola em gôndola, sessão orgânicos ou naquele cantinho esquecido para os estrangeiros. Sinto-me uma "gringa" fazendo compra no Santa Luzia e uma retirante chegando em casa com mil sacolas.

No fim das contas de carrinho em carrinho, a novidade passa e só ficam as boas histórias. No fundo todo supermercado é igual e é só questão de tempo para encontrar tudo que meu estômago pede. Próximo da lista: açaí!

Quase tudo é frito na Ásia. Talvez isso explique a quantidade
de óleos. São prateleiras e prateleiras só para eles.  

Na terra do arroz, um corredor com centenas de tipos. Acredite,
não é fácil escolher, nem fazer. Tem manual e regras de cada grão.
Complicado é encontrar pacote de um quilo.  

Outro produto que ganha destaque e corredor lotado é
o molho shoyu. Difícil é encontrar o "light".   

Muitos lugares você paga pela sacola. A maioria das pessoas
lota o carrinho apenas com os produtos e leva assim mesmo. 


novembro 02, 2015

Como uma onda no mar



"O oriente te engole se você não se deixar levar..."


Certa vez uma amiga que veio da Índia disse: "se você não se abrir para o oriente, ele te engole". Essa frase não saiu da minha cabeça. É isso! É isso! O oriente está me engolindo e cuspindo igual uma planta carnívora faz, devo estar sendo indigesta como um caroço.

Então qual a fórmula mágica para se "deixar levar" e adaptar com alguma tranquilidade? Para trilhar o caminho das flores e não das pedras, criei uma estratégia: lute, una e se entregue.

Comecei lutando, entrei para uma academia especializada, já que estou na terra do Muay Thai. Porquê não aprender com os melhores? Assim fiz; meus "coachs" são duros na queda e não quis ficar por baixo e encarei "dobradinha" de myai thai + boxe clássico. Primeira aula quase morri! Achei que fosse apenas na primeira, mas ainda continuo morrendo. Pelo menos já comecei a canalizar minhas frustrações de mulher mimada.

Todos os treinadores são lutadores profissionais, cada um com sua história, vindo de uma região do mundo, com costumes completamente diferentes, mas dentro do tatame essas diferenças acabam. É estranho pensar que em um esporte dito "violento" você tem tanta disciplina, respeito e hierarquia.

E para quebrar os paradigmas, estou conhecendo pessoas verdadeiramente doces que lutam como vikings. Contraditório? Nem tanto, se você pensar que é uma forma de se limpar de sentimentos ruins como a raiva, ódio, mágoas e frustrações. Fica mais fácil de entender como muitos lutadores são extremamente sensíveis. Estou convivendo com muitos desses campeões e conhecendo a nova face do esporte, que é paixão nacional, como o nosso futebol. Enquanto alguns se limpam, outros fazem o amor da vida. Além da troca de chutes e socos, trocamos diferenças culturais. O que mais gosto é entrar cumprimentado em várias línguas. A concentração de estrangeiros possibilita que ao mesmo tempo consiga ouvir no mínimo 6 idiomas. Um prazer sonoro de diversidade de sons.

ONE Championship (ONE FC).


Próximo passo: união

Tentei comida, hum, não deu, tentei fazer amigos, hum, não deu, então optei pelo silêncio. Pode parecer estranho, mas treino em duas etapas: vou para um local bem movimentado e fico apenas observando, são tantas vozes, olhares, jeitos, roupas e cheiros diferentes que logo a aversão me agarra. E por quê? Porque o diferente nos incomoda, põe em cheque nossa identidade e como o coletivo é sempre maior que qualquer indivíduo, por segurança temos aversão e nos afastamos.

Assim quando me afasto procuro elaborar em algum local mágico. Aqui em KL encontrei um ponto de energia sagrada, um santuário de peregrinação dos hindus: Batu Caves -- um dos principais pontos turísticos da cidade. São inúmeras cavernas. Você não pode entrar em todas, mas tem três sequências que você pode passar, sendo que os templos estão concentrados na principal. A conexão da natureza com o sagrado está nesse local. Não é a grande estatua de 43metros que mais chamou minha atenção e sim a grandiosidade da abertura das cavernas e a quantidade de animais livres que moram por ali. São cachorros latindo para os macacos, que gritam e escondem a comida nas árvores que envolvem as cavernas. Antigamente mestres viviam ali meditando. Ainda hoje tem iogues que vivem lá e são responsáveis pelos ditos "pujas", cerimônias com rezas e oferendas. Na comunhão da missa católica recebe a hóstia, no puja hindu derrama água de rosas em suas mãos, devem bebê-la e passá-la na cabeça. Não sou hindu e tão pouco sei o que significam, mas sempre saio com a testa toda pintada. Posso dizer que funciona e que é uma benção, um banho de energia embebida pelo toque de tambor seguido de uma flautinha, daquelas que parece que a cobra sairá do cesto. Dessa forma, sem palavras e nem entendendo muito o que acontece, encontro a tal desejada união.

Caverna principal da Batu Caves.

Entrega

Nada como se entregar para uma deliciosa massagem. Assim, achei a última chave para não ser engolida como uma onda no mar. Após fazer o enorme sacrifício de conhecer alguns "spas" e casas de massagem, encontrei a mão preferida.

Seu nome é Gean, dona de uma mão forte, olhos doces e rosto sofrido. Recém-chegada como eu, quando nos conhecemos falamos sobre a adaptação fora do país natal. Assim, realizei que independente da separação global oriente-ocidente, nossos apegos à família e à pátria são os mesmos. Gean vivia com os pais em uma cidade próxima a capital Bangkok, Tailândia.  Aprendeu o oficio da massagem e foi chamada para trabalhar em uma respeitosa casa tailandesa com mais de 20 unidades espalhadas na Malásia. Além das mãos e uma técnica impressionante, tem um bom coração, fala mansa e sincera. Tive de me render.

Spa Thai Odyssey em Bangsar. 

Confesso que o Oriente continua me engolindo, devido mais a minha mente instável, mas continuo na luta, união e entrega. E às vezes, somente às vezes, corro para a bolha ocidental em busca de colo de mãe.

Casa de chá TWG no Pavilion.